8 de janeiro de 2012

O Ladrão

Num dia naqueles em que todos resmungam do frio, acho que o mais frio do ano, fui para a faculdade, após o trabalho, como sempre de bicicleta, na janta encontrei uma amiga com um cachecol enrolado sobre os olhos, com dores de cabeça e fotofobia. Ao chegar às escadarias onde costumo prender a bicicleta um outro ciclista veio me perguntar se era tranquilo deixar alí. Eu disse que sim, disse apenas para ele tirar o velocímetro, porque já roubaram o meu, mas de resto de boa.

Depois do furto sem sentido, por ter sido o furto de apenas a parte de cima, facilmente retirável, que sem o resto não passa de um relógio que atrasa constantemente, decidi não comprar outro velocímetro, que havia sumido pela segunda vez, os dois me custando uns 40 reais. Na hora olhei para o meu guidão, onde só tinha o resto, encaixe, fio e imãs. Do lado tinha a minha lanterna de sinalização, com três funções e pilha fraca, importante para garantir que os carros não me fechem duante a noite, me custou 30 reais, o equivalente a umas 7 horas e quarenta e dois minutos de trabalho, já que neste emprego eu recebo 700 reais por 30 horas semanais o que dá mais ou menos 3,90 por hora. Uma vez quis prevenir de levarem a lanterna, deixei cair no chão de um metro de altura e ela quebrou. Não tiro mais.

Fui para as aulas. Na segunda o Profº Oswaldo Ceschin analizou um conto de Drummond, "O Ladrão". Minhas palavras não substituem a obra, procurem-na, mas basicamente o enredo trata-se de um narrador que fala de uma amiga, que percebe ter sido roubada. Os objetos tinham valor afetivo (e também um valor monetário que foi diminuido pelo narrador, já que alguns eram de ouro e/ou pérolas cultivadas). Diz-se que a personagem não tinha o "horror capitalista ao ladrão", diferente de um vizinho que tenta até caçar ele com arma de fogo. Cosme e Damião, que eram policiais cariocas famosos da década de 60, identificam e trazem o suspeito (com pedido da "amiga" de não o machucarem), ela dá uma de amiga também com o Curió, apelido do personagem que é descrito como pequeno, simpático. Chama ele pra sentar, bate papo, o faz confessar o crime. Ela assume também ter culpa, depois de acusada por ele de o por em tentação, deixando a janela aberta na época do carnaval (com certeza um dia quente). No final ele devolve parte dos pertences, porque alguma coisa tinha vendido e um brinco tinha dado à namorada, eles ficam definitivamente amigos, o vizinho se revolta e se muda.
O professor conclui que o conto é uma bonita história sobre um relacionamento afetivo.
A aula acaba, me troco, vou lá fora, saio e quando me toco sumiu minha lanterna frontal de sinalização.

Nada de "horror capitalista ao ladrão", mas nem tudo dá pra engolir.
Drummond não é mais meu herói.

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