18 de dezembro de 2010

Harpa esquisita

Dói-te a festa feliz da verdade da vida...
Tanges a harpa, em teu sonho, almas ou cordas, cantas,
Bóiam-te as notas no ar, a asa no azul diluída
E, assombrado, reptis — homens, não! Tu levantas,

E apupilam-te a fronte as mil pedras agudas
De ódios e ódios a olhar-te... E és um rei que as avista.
No halo, de amor, que tens! se em colar as transmudas,
Vais — um dervixe persa, o mato azul — Artista!

Inda olhar, adormido abre, e é de ocre, e avermelha!...
Vem colar-te ao colar.. e oh! tua harpa esquisita
Plange... flora a zumbir, minúscula, que imita
A abelheira dor, em centelha e centelha.

E é a sombra... E o instrumento, a gemer iluminado,
Como que à Noite estrela um núbio corvo... E lindo
(inda que as asas tens não terás ao lado)
Porque os pétalos d'ouro, a haste de prata, abrindo,

Um lírio de ouro se alça? os paços voam-te pelas
ribas... Oh! Que ilusões da flor, que tantaliza!
Sobe a flor? Sobes tu e a alma nas pedras pisa?...
Pairas... Em frente, o mar, polvos de luz — estrelas...

Pairas... e o busto a arfar — longe, vela sem norte.
Negro o céu desestrela, o seio aqueando: escuta.
No amoroso oboé solfeja um vento forte
e, alta, em surdo ressôo, a onda betúmea e bruta,

A ânsia do mar, lá vem esfola-se na areia...
Seu líquido cachimbo e mágoa acesa, e fuma!
E chamas a onda: "irmã". E em fósforo incendeia
Na praia a onda do mar, ri com dentes de espuma.

De ametista, em teu sonho, uma antiga cratera
Mal te embebe — alegria! — alvos dedos de frio,
Eis se te emperla o rosto e a prantear vês, sombrio
A onda crescer, rajar-se em Brutal Bêsta-fera!

Olhas... E, soluçoso, à música das mágoas
Amedulas o Mar e amedulas a Terra!
A sombra aclara... E é ver a dança verde de águas
E arvoredos dançando ao coruto da serra!

Gemes... Dedando o Azul as magras mãos dos astros
Somem, luzindo... Ao longe, esqueleta uma ruina
Em teu sonho a enervar argentina, argentina...
De ilusões, no horizonte, ossos brancos... São mastros!

Quente estrias a alma, à frialgem, nas cousas...
Que bom morrer! Manhã, luz, remada sonora...
Pousas um dedo níveo às níveas cordas, pousas
E és náufrago de ti, a harpa caída, agora.

Ah! os homens percorre um frêmito. Num chôro...
Move oceânica a espécie, amorosa, amorosa!
Mais que um dervixe, és deus, que morre, a irradiosa
Glorificaçãod e ouro e o solde ouro... à paz de ouro.
..............................................Pedro Kilkerry

Quando eu crescer vou escrever assim.

Nenhum comentário:

Postar um comentário